quarta-feira, 27 de abril de 2011


Jorge papeando com Ma Xi
Quando chego num aeroporto (sempre entediado), uma das primeiras coisas que faço é procurar rostos conhecidos. Encontros inesperados são comuns nesses locais. O retorno do Rio foi marcado por um encontro inusitado.

Na mesma tediosa situação, no Santos Dumont, estava o José Miguel Wisnik, músico e ensaísta, uma personalidade da cultura brasileira. E o Nei Latorraca, meio disfarçado com um bonezinho démodé. E mais. O Bernardinho, técnico da seleção brasileira masculina de vôlei. Este embarcou pra Brasília no mesmo vôo que a gente. “O que será que esse cara vai fazer em Brasília?” “Deve fazer uma palestra”, me responde a Fátima. E imediatamente apontou para um afrodescendente, fofinho, que estava perto do Wisnik. “Aquele não é o Jorge Moreno?” E era.

Ô meu amor... ainda com Ma Xi


O velho amigo, papa-peixe legítimo, embarcou conosco rumo a Brasília, onde ficou. Aproveitamos essa hora a toa para uma conversa, colocando os assuntos em dia. Jorge Bastos Moreno, ou simplesmente Moreno, foi meu vizinho nos anos 70. Morávamos atrás da Escola Técnica (hoje tem outro nome). Eu me preparava para o vestibular e ele estudava comunicação em Brasília. Nossos interesses por literatura nos aproximaram e lembro-me que Moreno era meio apaixonado por uma amiga da minha irmã, chegando ao ponto de, numa bebedeira, rasgar um retrato 3X4 dela e sorvê-lo como tiragosto, entre um gole e outro.

Como jornalista, foi catapultado para a fama após um furo. Foi o cara que descobriu e fez a primeira entrevista com o Figueiredo, último presidente militar do Brasil. Hoje Moreno é um dos jornalistas de destaque da mídia brasileira. Seus textos atraem multidões de leitores e é um dos homens fortes da Globo. Conhece e se relaciona bem com políticos e artistas vários. Enquanto conversávamos no aeroporto, recebeu um telefonema da Mariana Ximenes, que eu não sabia direito quem era. Me mostrou a foto dela e o provoquei: “A testa dela é muito grande”. Fátima me lembrou da minha própria testa... Deixa pra lá.    

E seguimos conversando fiado em torno de assuntos passados, presentes e futuros. Lembramos de seus pais, Juca e Alzira, que eu conhecia bem e estão hoje no andar de cima. Alzira fazia uma limonada suíça especial, que nos servia com pão com manteiga. Bateu aquele velho e conhecido saudosismo que sempre me acomete quando escrevinho por aqui.

Lembrei-o de que nos anos 80, quando estava internado num hospital no Rio, fui visitá-lo e ele implorou por um cigarro. Dei-lhe um, na moita. Acendeu e se espantou com a primeira tragada. Olhou para o cigarro, um Continental sem filtro. Embarcamos.


Em Brasília, na troca de aeronave, voltamos a trocar palavras e marcamos uma peixada em Cuiabá para daqui a uns quinze ou vinte dias. Ele é muito ocupado, mas não pretende romper seus laços com Cuiabá. Tomara que dê certo. Confessou-se cardíaco e eu sugeri que um pouco melancólico também. As duas coisas combinam, segundo Drummond. Gracejamos em torno de enfartes, aventuras hospitalares e seus medicamentos protoultracoronários.

Nos anos 80, lembreio-o de quando estava internado num hospital no Rio, fui visitá-lo e ele implorou por um cigarro. Dei-lhe um, na moita, acendeu-o e se espantou com a primeira tragada. Olhou para o cigarro, um continental sem filtro.

Nos despedimos enquanto ele marcava um almoço da hora com alguém pelo telefone. No Porcão, churrascaria manjada em Brasília. Acho que disse algo ou olhei-o como que censurando, pela sua condição de cardíaco...  Já descendo a escada rolante e se afastando, acenou-me dizendo: “Vou comer uma salada... Uma salada de linguiça”.




Muvuca no desembarque

terça-feira, 26 de abril de 2011

Beatriz, detalhe
As aventuras do Tyrannus no Rio de Janeiro estão com o tempo regulamentar praticamente esgotado. Cuiabá passa a ser nosso chão nesta quarta-feira. Duas coisas ficam desta viagem, como sempre: foi bom enquanto durou e é muito bom voltar pra casa. Nas duas últimas noites cariocas, primeiro, um discreto pileque no Leme, no aconchegante “ap” de Valéria del Cueto, a companhia de Beatriz – a filha desgarrada já meio carioca, e muita, muita chuva desabada por São Pedro: maior aguaceiro. E na última noite, uma noite família: jantar a base de ratatouille, salada caprese e linguado frito. Ah, e um scotezinho pra desanuviar.

Sapatos... paixão


A programação cultural não chegou a ser aquela coisa toda. O balé Giselle no magnífico Teatro Municipal do Rio, restaurado, foi emocionante. O segundo ato é de arrepiar, numa atmosfera onírica. A coreografia clássica ganha encantamento com o “tutu” na altura da panturilha das bailarinas (realmente, faz a diferença) . Momentos que lavam e elevam a alma da gente. Alimento de primeira para o espírito. Faz bem. A minha empáfia diante de tanta beleza e num ambiente tão sofisticado estava de fazer inveja

Estilo coluna social, no Teatro Municipal

Na galeria

Gran finale...

Aguardem a bailarina

Se Giselle foi encantador, não podemos dizer o mesmo de “A Lição e a Cantora Careca”, peça teatral com texto de Eugène Ionesco, aquele mesmo do teatro do absurdo. Foi uma grande frustração. Me lembro de ter assistido a mesma peça, noutra montagem, há algumas décadas e quase morri de tanto rir. Desta feita, a encenação não decolou. O elenco, com atores do naipe de Nelson Xavier, Cecil Thiré e Thelma Reston, sob a direção da experiente Camilla Amado, não se encaixava, faltou “time” fazendo com que o espetáculo não acontecesse na hilaridade que o teatro do absurdo propõe.

Foto absurda do teatro do absurdo

Fomos também à feira de antiguidades da Praça XV, não só de antiguidades, mas também de cacarecos. Rolou até uma tomada, não sei se de novela ou cinema, no meio do povão. Maior muvuca, como sempre mais dos produtores. Depois disso, uma conferida na exposição de Laurie Anderson no CCBB. Acompanhamos a trajetória dessa artista musical performática americana, que é acusada de vanguardista há mais de trinta anos. Dessa mostra ficou a lição de que morremos três vezes: primeiro, quando o coração para; depois quando somos cremados ou enterrados e, por último, quando deixam de falar da gente. Um a zero para os grandes e mais nobres imortais, que são aqueles que não morrem jamais, por causa do talento que os eterniza através de suas obras.

Garimpando
Set

Faltou a praia. Deixamos para ir nos últimos dias, mas rolou chuvarada. Na semana passada fomos a Ipanema, mas chegamos já por volta das cinco da tarde e a água meio fria só me permitiu molhar os pés. Sobrou uma caminhada pela orla, coisa que já vale a pena. Ipanema é sempre Ipanema. Improvisamos uma rápida visita a outra exposição, “Alucinação à Beira-Mar”, na Casa Laura Alvim, trabalho criativo do artista carioca Marcos Chaves metaforizando possibilidades de visuais e sensações litorâneas.

Entardecer na lagoa Rodrigo de Freitas

Sol e mar para todos

Ambiência de Marcos Chaves


Paixão

Entre os melhores momentos que passamos aqui está a nossa presença no Fla Flu, nobre clássico do futebol brasileiro que Nelson Rodrigues comparava ao Big Bang. Com razão. Gostar de se emocionar e se deixar levar pelas sensações que nos são provocadas faz parte do estilo Tyrannus. Mesmo que seja meio melancholicus, que é o que acontece quando time da gente perde. O Engenhão, com muita chuva, abrigou pouco mais de vinte mil pessoas num clima pacífico com as torcidas se manifestando bem ao estilo do humor carioca. Esse tipo de coisa me faz sentir em casa aqui no Rio. Que alegria xingar o juiz e o Luxemburgo, que raiva pelos gols que o Fluminense perdeu e que sofrimento na hora da disputa nos pênaltis. Foi tanto o nervosismo que deu um tilt na máquina fotográfica.





Rolandos leros

Arte e futebol são paixões enraizadas em mim. Essas coisas imprevisíveis que existem neste mundão, acho que são as melhores. E isso o Rio de Janeiro oferece.

Adoro esta cidade e mesmo antes de decolar já sinto saudades. Dizem que a família é uma célula social que vem se desintegrando ao longo da trajetória da humanidade. Não penso e nem ajo assim. Tenho certeza do amor que sinto pelos meus entes queridos e da recíproca que é verdadeira.

Saída para o Fla X Flu


quarta-feira, 20 de abril de 2011


Do avião... a Baia da Guanabara
Era ao mesmo tempo bela e banguela a Guanabara. Uma definição poética-realística da baía mais famosa do Brasil. Talvez porque tudo neste país seja assim meio extremado. E cá estamos, em Botafogo. Eu com pais e filha e irmãos e sobrinhos; e a Fátima com filha, sogros, cunhados sobrinhos. Seio familiar. E a música do Caetano embalando pelo menos este começo de texto. Espero que não esteja presente o texto inteiro, porque não é pra ser bem assim, ou pelo menos não é o ideal... Ou não...

Favelas e mais favelas entranhadas numa selva de concreto, buzinas, alarmes, sirenes e o ruído infernal da urbe. Morros gigantescos e pedras, tudo entremeado, se avolumam neste singular relevo, o que faz desta cidade, única. Sua geografia acidentada, marca registrada. Daí, lógico, vem a comparação do Lévi-Strauss, citada na música do Caetano. A Baía da Guanabara, em toda sua imensidão, cercada por um revelo irregular, morro e pedra alto e baixo, parece mesmo uma boca onde falta um ou mais dente, ou só um toquinho de dente.


O Cristo e o ... 


Dona Santa Marta, da janela do quarto

O que dizer do carioca? Eu, como nasci em Niterói e tenho um passado cheio de laços com o pedaço (mas, me sinto mais cuiabano), gosto do povo carioca. Só que tem aquela história: gente boa tem em toda a parte. E filho da puta também. Puta também é gente e pári, na falta de uma explicação mais científica ou convincente em torno das diferenças entre os povos de cada cidade.


Na trilha do Parque Lage

Plantas e animais exóticos
 

Tubarões siameses


Gente cavernícula

Cenário cult

E vem aí o Dia do Choro, sábado (23), quando Valéria Del Cueto (blog) vai nos ciceronear num babado musical aqui no Rio, terra de Pixinguinha, que nasceu no finalzinho do século 19, no Rio, e morreu em 1973. No Rio. Pixinguinha morreu, mas virou projeto. E dá-lhe música. Tenho um amigo, o Juliano Yule, cuiabano que estudou no Rio e, se não me engano, foi ao enterro do grande músico.

Viemos ao Rio tipo a negócios de família. Mas claro que já tivemos acesso a pelo menos um programa turístico, um delicioso passeio pelo Parque Lage. Guiados pela Bibi, nossa parenta demais de próxima. Mais do que este blog, ela é nossa filha primogênita. Um parque dentraço da cidade com intensa vegetação, muitas árvores seculares. Cascatas, um pequeno aquário onde tem até um tubarão siamês, do qual nunca tinha ouvido falar, lógico. Acho que isso não tem no pantanal.   



Procurando no Rio antigo...
 
Nos arcos ...


O nosso Rio

Lá dentro, um prédio antigo abriga uma escola de artes plásticas e tem uma cantina. Uma paradinha. Uma aguinha, porque a azia tá batendo. Exagerei na torta de banana que a mama fez. Fato recorrente aqui.

"Nossos ídolos ainda são os mesmos..."


segunda-feira, 18 de abril de 2011

O guardião da cidade maravilhosa
Dependendo da hora em que você lê o Tyrannus, a gente tá em Cuiabá, ou no Rio de Janeiro. Ou no ar. A caminho. Que felicidade que é viajar. Trocar de ares, de paisagem e quebrar a rotina. Rotina, cá entre nós, é coisa pra ser estraçalhada. A vida também é feita de sacolejos. E não custa lembrar que o blog aqui surgiu por conta de uma viagem.


Enquanto vou escrevendo aqui, a Fátima briga: “Que mania que você tem de ficar sem camisa... É horrível”. Pô, pega leve muié, se eu não puder ficar sem camisa em minha própria casa, é o fim do mundo. Eu escrevo, e ela também. Deixa um glossário no seu manuscrito estilo receita médica para a coitada da nossa ajudante das tarefas domésticas.



Mulher virginiana, já viu né. Organizada até não poder mais e na linha meio Tyrannus. Sobra pro companheiro, então, o Melancholicus. E assim a gente vai supervivendo. Sobreviver é pouco, insuficiente.


Se tem uma coisa com a qual uma viagem combina é expectativa e ansiedade. Eu odeio estar no avião, aquele espaço confinador, aquela comida estereotipada. Mas só de imaginar que amanheceremos no Rio e, como vamos desembarcar no aeroporto Santos Dumont, teremos uma bela vista da Baía de Guanabara, sorrio por dentro. Que felicidade.


Antigamente, quando viajava para o Rio, na chegada o comandante, comissário de bordo ou sei lá quem da tripulação colocava a música...”Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara”... Eu adorava.

Aeromoças, quando eu era criança pequena lá em...

Ir pra uma cidade do porte do Rio implica sempre num cardápio cultural mais seletivo, já que as opções são multiplicadas. O ballet Giselle, que abre a temporada do Theatro Municipal do Rio de Janeiro está em nossos planos. É um clássico romântico do repertório mundial, que completa 170 anos. A música foi composta pelo francês Adolphe Adam (1806-1856).

Giselle (foto: Alice Bravo)


Giselle (Foto: Alice Bravo)

Fora esse ballet, estamos em aberto... Claro que além de uma praia, chopinho, comes e bebes, encontros familiares e com amigos, estamos acatando sugestões, até porque, não tivemos ainda a paciência/tempo pra investigar o roteiro do Rio por estes dias...

Putz, domingo tem FlaFlu. Será que eu encaro?


A guardiã
E é isso aí galera. A gente vai ficando por aqui nesta postagem, mas mandaremos notícias das terras cariocas. Aqui em casa, curtindo a solidão, fica Nikita, a modelo oficial deste blog...  


sábado, 16 de abril de 2011

"Um lance de dados jamais abolira o acaso"

15 de abril. Se compadre Chico estivesse vivo (o cara se mandou em 2002), completaria 55 anos. “Eu me amo, mas não sou correspondido” ... inventou. Esse negócio de morrer é complicado. Parece que fica uma dívida em algum lugar incomum do coração. Duvidá. Então, a gente reservou os últimos momentos desta sexta revirando archivos, poeiras e fungos. Até encontrar o destino desta data aniversária. Só pra(zer) com(partilhar) vocês uns caquinhos que ficaram registrados das nossas aventuras na terra do sempre, com Chico Amorim. Autêntico cuiabano, de família tradicional, noveleiro e erudito!




- Seria brincadeira? Sem dúvida, mas sua irmã lhe falou há cerca de uma semana: esse seu amigo foi visto com um pessoal esquisito tarde da noite disfarçando alguma coisa ali perto da rua de cima, mas se for verdade; teria coragem?... desde os sete anos, como um irmão... cresceram juntos, não... bem...
- Tem cigarro?
- Ah! Respondeu abandonando as conjecturas.
- Tem cigarro? Não, eu quero a carteira.
Foi tomado por uma semi-tremedeira – pra que a carteira se tem um cigarro acesso na boca – pensou, e começou a suar frio, um embrulho no estômago.
O carro deslizava pelas ruas a uma velocidade moderada, no banco da frente um rapaz com a cabeça raspada (calouro da universidade) e uma garota de cabelo louro e curto que falou: deixa que eu enrolo, abrindo a bolsa e tirando uma bola de papel.
Com uma vaga esperança, a exemplo de quando não respondia a nenhuma questão nas provas da aula e conservava a expectativa de uma nota razoável, tentou ainda se iludir, porém um cheiro forte encheu o interior do carro quando a mocinha acendeu o cigarro-sem-marca.
E agora, que desculpa iria dar para não fumar, falar que se soubesse que era para isso eu não entrava no carro... não, pra gozarem na cara dele depois é? Mentir que tinha problemas no coração? Essa não pega, alguém já havia usado sem sucesso. O problema não era agora, pensava, mas depois que estivesse viciado como iria arrumar dinheiro pra comprar e já se via roubando as jóias da mãe, vendendo a própria irmã e lembrava “a maconha em si não faz mal mas é um trampolim para outras drogas” tudo isso ele já sabia através da a”Família Cristã”, é verdade tava lá na revista. O quê que deu na sua cabeça pra mentir que já tinha experimentado quando lhe perguntaram ontem, pensou.
Agora estava feito. Fumou. O amigo (o falso amigo) sorria e olhava para ele. Ele também sorriu; passou o cigarro-sem-marca para o careca do banco da frente, este parecia impaciente. Um carro passou por eles.
- Tá sentindo alguma coisa? Perguntou o amigo (o falso amigo).
- Estou! Estou ótimo. Na verdade não sentia nenhuma diferença, nada de estranho.
Passado o impacto começou a divagar novamente sobre o assunto, encostou a cabeça ao vidro lateral do carro e uma ideiazinha começou a formigar-lhe a mente, olhou a garota – é bonita – será o quê que vai acontecer agora, eu acha que ela... parece que quando fumam, elas... mas ela não tema cara de quem dá, mas não tem cara de quem fuma maconha também e, se fuma, com certeza deve fazer de tudo, faz sim eu li numa revista, tem até uma que morreu e tava com uns cinco homens quando encontraram ela no apartamento nuinha... ai, ela tem uns peitinhos durinhos e que boca, parece com a Vera Fischer. – Ia abrir a boca pra perguntar algo pro amigo (amigo do peito) quando este lhe estendeu novamente a mão para passar o cigarrinho que já tava quase no fim. Fumou até queimar os dedos.
- Não tem mais nada, falou pro amigo, e este respondeu que podia jogar fora.
Começou a rir, do que será que estava rindo..., o careca e a Vera Fischer também riam. O rádio tocava uma música – bonita essa música – olhou o cinzeiro do carro, estava cheio de tocos de cigarro, sentiu que o cinto de segurança lhe incomodava a perna, afastou para um lado o cinto de segurança, abriu a carteira de cigarros e tirou um, pegou a caixa de fósforos e dali retirou cuidadosamente um palito, riscou e ficou olhando a chama que se apagou com o vento, acendeu outro palito e agora sim aproximou-o do cigarro e acendeu, olhou para as mãos e reparou as unhas meio grandes. (1978)



Quero um pedaço de pão



Todas estas coisas
Que sobrevoam a minha mente
Quando em versos se desfazem
Me deixam meio frustrado
Porque perdem seu mistério
E me parecem diferentes
Todas estas coisas
Que minha mente
Sobrevoam
Me deixam meio frustrado
Quando em versos se desfazem
Porque perdem o mistério
Que as confere o pensar
E diferentes parecem


Quero algo mais profundo
Não quero saber de mim
Nem quero o saber do mundo
Quero algo mais profundo
Não quero saber do mundo
Quero um pedaço de pão
Quero algo mais profundo:
Me afundo


Não tem mais nada...e este respondeu: pode jogar fora


Eu queria ser muito rico
Para ter todas as drogas
Que conduzem meu pensamento
Palavras e obras



Atrás de mim
A vassoura do tempo
Varrendo os rastros
Do meu passo
Apagando todas as paixões
Com o estardalhaço absurdo
Do silêncio




Hollywood, Hollywood comigo ninguém pude








quarta-feira, 13 de abril de 2011


Até amanhã! Não, não estou me despedindo do internauta já na abertura do texto. Apenas comecei-o com uma frase do meu pai, quando quer dispensar algo chato, desagradável, maçante, desnecessário. E o até amanhã cabe também para esta quinta (14/05), último dia para regularizar sua situação com a justiça eleitoral, se você andou não votando em 2010. Essa informação a gente pescou no blog http://meupalco.com.br/. Se você não se virar, não agitar, não cumprir seu papel político nesta quinta, babau. Seu título de eleitor será cancelado e trocentas medidas punitivas estranhas relacionadas ao ridículo que é a obrigatoriedade do voto desabam em sua cabecita.

“Até amanhã, voto obrigatório. Odeio você!”. O até amanhã tem o mesmo sentido que meu pai aplica na expressão. Voto... Vôte! Revista cultural do Wander Antunes? Não, ‘vôte’ expressão cuiabana que designa nojo, desprezo, raiva de algo. No meu caso, do voto. Voto obrigatório. Obrigatório, eu disse. Porque se o voto não fosse obrigatório, até que seria bacana. A gente sair de casa num feriado pra registrar um voto (de confiança) neste ou naquele candidato (a), simplesmente, por acreditar que essa pessoa merece o nosso apoio. Mas merece o nosso apoio, meeeesssmmoooo. Não é aquela coisa mais ou menos, de ter que optar por alguém menos ruim. Puxa, será que ainda vou presenciar isso? A desobrigatoriedade do voto no Brasil?



Acho que sim. Viver uma virada de século, de milênio, presenciar o advento da internet, ver alguém oriundo da classe operária presidir o Brasil, e um negro, os Estados Unidos; são coisas, acredito, com mais peso do que o direito de votar ou não.

Nenhum argumento na defesa do voto obrigatório, até a presente data, me convenceu. Ah, e como escrevo isto em pleno “dia do beijo” (13 de abril – um beijo pra mama, Rosinha, que tá de aniversário neste dia), lembro-me quando o voto ainda não era digital e algumas mulheres tiveram seus votos anulados porque beijaram a cédula, que ficou marcada de batom. Que coisa triste. Política e romantismo, tudo leva a crer, não combinam mesmo. Chega de voto. Voto agora pelo beijo. Beijo tem muito mais a ver com poesia do que com política.


Beijo pouco, falo menos ainda

Mas invento palavras

Que traduzem a ternura mais funda

E mais cotidiana

(Manuel Bandeira)



Você sabia que hoje é dia do beijo? – Eh. Pois é, tava pensando... se... não dava prá... - Ah, não enche o saco!





No amor o beijo é o primeiro contato íntimo, o primeiro desejo... que desperta os demais. É com o beijo que ansiamos devorar, trazer pra dentro de seu corpo o ser amado. Portanto, é a primeira penetração, antropofagia pura. O prazer proporcionado pelo encontro dos lábios desencadeia processos químicos. O amor é pura química. O beijo, além de despertar paladar, olfato e tato, enlouquece 10 milhões de células nervosas, carregadas de energia.








O beijo que ficou pra eternidade




Beijo defronte ao Beijo de Rodin





O beijo é ainda um sinalizador. Quando a chama do amor atenua, os beijos se rarefazem.


Pede-se beijo com jeito, gosto de “Beija eu” e claro, "Bésame mucho".



Beija eu!


Beija eu!


Beija eu, me beija


Deixa o que seja ser.


(Beija Eu - Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Arto Lindsay)





E ainda tem essas e... muitos mais.







Já sei namorar


Já sei beijar de língua


Agora só me resta sonha


Já sei onde ir


Já sei onde ficar


(Já sei Namaorar – Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown)





Aquele beijo que te dei


Nunca, nunca mais esquecerei


A noite linda de luar


Lua testemunha tão vulgar


(Aquele Beijo que te dei – Roberto Carlos)












ainda estou aprendendo

a te conhecer melhor.

sigo suas pistas e reparo

no seu cabelo todas as vezes em que nos encontramos.

às vezes nem te beijo e

é quando mordo a sua sombra.

tem dias que te beijo

e então tudo fica mais ou menos confuso.

você é mulher musa

que surgiu numa dessas esquinas da vida

pra sacudir o meu destino.

te conheci e te gosto

mas gostaria de saber te usar melhor.

cadê o seu manual de instruções?

(Lorenzo Falcão)








segunda-feira, 11 de abril de 2011

Sábado e a opção de não sair... Às vezes custa caro. Imagina só, sábado iniciando o quase final de noite. A cerveja, antes maravilhosa, desce meio que a contra gosto, a conversa meio difícil de engatar (pudera desde as dez da matina proseando), chega uma hora que esvaece a mente turva e turbinada. E aí fazer o quê? Zapear a procura de um filme ou programa bacana, checar os gravados... De vez em quando dá certo, outras nem tanto. Uma boa pedida é vasculhar canais inusitados como TV Escola, TV Câmara e Senado (!!!), TV Fashion, Multishow, TV Cultura, Sesc TV, Canal Brasil e outros nem tão óbvios. Bom, isso é o que o nosso pacote de TV paga oferece.


Tirando um som Thelonius Monk



Nessa busca frenética achamos pérolas. A última investida foi gratificante. Paramos estatelados diante da telinha com uma figura estranha: uma mulher diferentona, que falava mais do que a boca, aliás que bocão. A eloqüência, a perspicácia, a ironia insultante e a clareza fora do comum ao se expressar, nos fez tomar a primeira providência: apertar a tecla rec. Gravar.







Claro, fomos atrás de informações básicas: era um documentário - “Public Speaking”, produção de 2010, dirigida pelo incrível Martin Scorsese. O nome da figura, Fran Lebowitz. Nunca tínhamos ouvido falar dela. Queríamos mais, partimos pra internet, o youtube e Google... Ela é americana, judia e lésbica. Nasceu em 1950, em New Jersey e chegou a Nova York em 1970. É escritora, mas há vinte anos nada publica. Foi colunista da revista Interview, fundada por Andy Warhol. Ganha a vida “falando em público”.



A edição do filme é primorosa e às vezes a gente nem percebe que de uma palestra em público, a cena passou para uma longa entrevista que é a linha mestra do doc. Na verdade é uma conversa ágil onde o próprio Scorsese é o cara que puxa a língua de Lebowitz, quando não desata numa gostosa gargalhada.



Ao longo do documentário vão surgindo artistas e outras personalidades que pontificaram na sempre efervescente Nova York, mas que são contemporâneas de Fran. Gente como Andy Wharol, Serge Gainsbourg, James Baldwin, Thelonius Monk e outros.

Já plenamente ambientados com o discurso mordaz e espirituoso dessa lady, cuja fisionomia lembra o Geoffrey Rush, percebemos que a força de suas ideias reside, principalmente, no fato de que ela é muito econômica em suas citações.

É ele ou ela?


Ela deve ter uma formação cultural esmeradíssima, além do convívio com grandes artistas de sua época. Mas o que sai de sua boca é a contextualização, uma leitura única, sábia e demasiado particular do que outros pensadores (artistas também são pensadores, claro) postularam.




Definitivamente, Fran Lebowitz não é uma estação repetidora, como muita gente por aí que não consegue ir além do jardim. Fran Lebowitz, portanto, é o cara. Alguém que não sai emitindo opiniões a bel prazer. Uma pessoa que sabe formular conceitos e desaguá-los nessa realidade singular em que vivemos.


Pendurado Serge Gainsburg

 Um personagem como Fran é peça rara. Ícone do século XXI. E um cineasta como Martin Scorsese é o que há. Os dois são a cara de NY. A trilha sonora é especial e a música New York USA de e com Serge Gainsbourg, caiu do céu. Ou do arranha céu.  
   


Fran mostrando os caminhos